Cultura

O que foi a Revolução de 1932, que completa 89 anos nesta sexta?

Cidadãos, inclusive da RMVale, mantêm viva a memória do Nove de Julho, data em que paulistas pegaram em armas contra o golpe de estado instaurado dois anos antes

Escrito por Ana Lígia Dal Bello

09 JUL 2021 - 12H18 (Atualizada em 10 JUL 2021 - 09H23)

Filipe C. Oliveira/Arquivo Pessoal

Hoje é feriado de Nove de Julho ou dia da Revolução Constitucionalista de 1932. A ocasião, celebrada apenas no estado de São Paulo, marca o conflito armado que ocorreu de julho a outubro, de São Paulo e sul do Mato Grosso contra o Rio Grande do Sul e o resto do país.

São Paulo perdeu a batalha, mas conseguiu a constituição de 1934. 

Foram construídas trincheiras em várias cidades do Vale do Paraíba, como Guaratinguetá (a última a ter se rendido), Cruzeiro, Lavrinhas, Aparecida, Cunha, Cachoeira Paulista, Taubaté, Areias, Silveiras e Lorena.

Embora não tenha havido conflitos em São José dos Campos, a cidade enviou joseenses para os campos de batalha. Ela abriga o monumento MMDC, em homenagem aos quatro jovens mortos durante manifestação constitucionalista: Martins, Miragaia (joseense), Dráusio e Camargo.

Prefeitura de SJC/Reprodução
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O que foi a Revolução de 1932, que completa 89 anos nesta sexta-feira?


Contexto

Com o golpe de 1930, em que Getúlio Vargas assumiu a presidência do Brasil e pôs fim à política do café com leite (que garantia a alternância de poder apenas entre São Paulo e Minas Gerais, os mais poderosos economicamente), os paulistas passaram a reivindicar novas eleições e nova constituição.

Poucos conhecem a história e sua relevância, principalmente, para os valeparaibanos. No entanto, há quem trabalhe para compartilhar e recuperar este episódio da nossa história.

É o caso do funcionário público Filipe da Costa Oliveira, 37 anos, morador de Queluz, que vasculha trincheiras em busca de artefatos perdidos nas batalhas, como munições, moedas, balas de canhões, fuzis e mais. Ele utiliza detectores de metais, um deles construído por ele mesmo.

“Comecei a procurar nas trincheiras há uns três ou quatro anos, mas coleciono materiais da revolução desde os 13 ou 14 anos de idade”, relata Oliveira.

A curiosidade surgiu quando sua professora de história, Renata Garcez, comentou sobre as pilastras no centro do rio Paraíba do Sul. “São destroços da antiga ponte que foi dinamitada durante a revolução”, recorda-se.

Filipe C. Oliveira/Arquivo Pessoal
Filipe C. Oliveira/Arquivo Pessoal
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Relíquias nos campos de batalha

“Já encontrei tudo quanto é tipo de material que você possa imaginar que seja usado numa guerra, mas material de pequeno porte, desde munição de fuzil até munição de canhão de 75 milímetros”, continua.

O explorador ressalta que os objetos encontrados já estavam 100% inertes, já que a maioria das trincheiras ficam em zonas de eucalipto, que sofrem queimadas constantemente. “O explosivo que não detonou com a queimada não detona mais”, afirma.

O paulista da RMVale conta que, ainda hoje, encontram-se peças da revolução espalhadas pelos campos de batalha. “Muitas vezes, você nem precisa de um detector de metal, os objetos estão na própria superfície, já desenterrados”, conta o colecionador, que já percorreu cerca de 70% das trincheiras de Queluz.

Filipe C. Oliveira/Arquivo Pessoal
Filipe C. Oliveira/Arquivo Pessoal
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Registros compartilhados

Oliveira mantém um acervo particular em Queluz, aberto aos visitantes com horário marcado. Também já doou grande parte dos artefatos à PM (Polícia Militar), museus locais e escolas públicas.

“Meu objetivo com essas doações foi realmente preservar a história do povo paulista, do soldado constitucionalista. Mesmo essa munição tendo vindo de uma cidade diferente, (talvez) doada por um quartel da PM lá de São Paulo, o Dois de Ouro, por exemplo, ela está lá representando o constitucionalista, porque grande parte do contingente que lutou na revolução era da Força Pública de São Paulo, que é a atual Polícia Militar de hoje em dia”, explica.

Além disso, o funcionário do Centro Cultural de Queluz Malba Tahan espera despertar a curiosidade das crianças por saber o que é, como foi e o que aconteceu durante a Revolução de 1932.

Seu esforço já rendeu até reconhecimento da Câmara Municipal de Queluz e Prêmio Ordem do Mérito Coninter Artes, concedido por Araraquara (SP), que recebeu doações de “bens históricos”, como cartuchos, projéteis, clipes de carregadores e fragmentos de morteiros, entre outros.

Sobre o orgulho paulista, Oliveira não hesita. “Com certeza me orgulho muito de ser paulista, porque o paulista, em 32, mostrou que São Paulo é a locomotiva do Brasil. Quando se viu fechado por todas as fronteiras, embargos federais e tudo o mais, São Paulo se tornou uma grande máquina de guerra, produzindo seus próprios armamentos e replicando alguns estrangeiros. Me orgulho não só por esse motivo, mas por vários outros também”, conclui.

Filipe C. Oliveira/Arquivo Pessoal
Filipe C. Oliveira/Arquivo Pessoal
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Grupos na internet resgatam memórias da “Guerra Paulista”

Basta digitar “Revolução de 1932” nas redes sociais para encontrar grupos, inclusive da região, com membros ativos, que compartilham fotos e relatos de eventos marcantes.

Um deles é o Sociedade Veteranos de 32 - MMDC, ligado ao grupo fundado em 1954 por ex-combatentes da revolução, com o objetivo de preservar o episódio histórico na memória do povo de São Paulo.

Criador da comunidade online, o historiador Rodrigo Gutenberg, 35 anos, revela uma das principais características dessa revolução. “É consenso geral que a revolução é um capítulo muito importante na história do Brasil e de São Paulo porque tinha ideais nobres como democracia, liberdade e reivindicação de constituição”, explica.

Wikipédia/Reprodução
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Ele esclarece por que a nossa região teve tanta importância na época. “O Vale do Paraíba faz divisa com Minas Gerais e Rio de Janeiro, dois estados cruciais para que a revolução tivesse êxito. Não existiram batalhas em São José, mas era entreposto para outras cidades onde existiram, era utilizada para abastecer tropas e para outras atividades que o exército precisasse”.

O conflito de três meses teve fatos que impressionam os amantes da história, além da morte de MMDC. “Uma mãe que teve seus seis filhos combatendo na revolução; nenhum morreu. Outra mãe perdeu um filho na Revolta dos Dezoito do Forte de Copacabana, em 1922 e, em 1932, perdeu o outro”, relembra Gutenberg.

“No 7 de setembro de 1932, um soldado paulista caminhou por uma área onde poderia levar tiros. Quando o viram pendurar a bandeira do Brasil, os outros soldados constitucionalistas prestaram continência e tocaram a Marcha Batida (composta pelo Major Joaquim Antão Fernandes, em 1894)”. Naquele 7 de setembro, os tiros do “outro lado” cessaram por um momento.

Houve também a Campanha do Ouro, promovida pela Associação Comercial de São Paulo, que pedia ao povo doações de ouro e metais valiosos para ajudar nos esforços de guerra. A maioria das pessoas contribuiu com alianças de casamento, na falta de outros objetos valiosos.

Ao final da revolução, a associação doou o restante do metal para a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, que construiu o edifício Ouro para o Bem de São Paulo.

Wikipédia/Reprodução
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Este capítulo é quase totalmente ignorado entre os brasileiros e os próprios paulistas. O historiador tem uma hipótese. “O ensino de história é mal aplicado, alguns temas ficam de fora da grade curricular, a revolução é um deles. Não acredito que tenha sido proposital, mas com o tempo, quem assumia as áreas de educação não havia vivido aquela época ou talvez não aprenderam sobre o tema. Talvez seja questão ideológica. Não é de hoje que essa coisa de destruir ou apagar a Revolução de 32 acontece”, argumenta.

Por fim, Gutenberg fala sobre a importância dos grupos de redes sociais que abordam este combate que originou livros, nomes de ruas e monumentos na RMVale e no estado.

“A internet favoreceu que as pessoas se informem sobre tudo. Se o governo não ensina a própria história, a internet reúne pessoas que gostam de fatos históricos, cria grupos que ajudam a manter a memória desses feitos. Muito tem sido restaurado e resgatado graças a isso”, conclui.


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