Por Meon Em Opinião

Coluna da Nikoluk: De Brumadinho a Suzano, tragédias para jamais esquecer

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Vista de comunidade coberta por lama após rompimento de barragem em Brumadinho

Arquivo/Agência Brasil



Dia 13 de março de 2019, uma data que nunca será esquecida... e tenho, pessoalmente, dois fortes motivos para jamais esquecer. 
Um deles, pelo amor. O outro, pela dor. Porque no dia 13 nasceu uma “reflexão dolorosa”, um grito de “basta” pela tragédia e pela urgente necessidade de reavaliar nossos rumos. 

Que Brasil somos hoje? Que Brasil queremos para amanhã?  E o que fazemos para chegar lá, para alcançar esse Brasil que queremos?

Impunidade leva à reincidência criminal, que leva ao desperdício de esforços das forças de segurança (o famoso “enxugar gelo”), que leva à falta de civilidade, que leva ao... caos!

 

Tenho duas irmãs mais jovens, pessoas do bem, tremendamente positivas e cheias de boas energias. A mais nova é advogada, somos vizinhas e nos vemos com maior frequência. A outra é médica, trabalha há mais de 20 anos salvando vidas e melhorando a saúde das pessoas. Como ela mora e trabalha em Campinas/SP, não nos víamos há mais de seis meses. 

Ocorre que no dia 13 de março, minha irmã (médica) faz aniversário e, inopinadamente, resolvi fazer uma surpresa. Sem avisar ou combinar nada, fui com minha mãe a Campinas, arriscando uma tentativa de almoçar com a aniversariante, em meio ao seu dia de trabalho. E o resultado não poderia ter sido melhor: conseguimos reunir nossa família no próprio dia 13 de março e foi inesquecível, emocionante ver o susto, a emoção maravilhosa e as lágrimas dela – e as nossas também – com todos lá, reunidos por amor! 

Sim! Foi um dia inesquecível que, sem dúvidas, será eternizado no coração... porque valorizo e sou grata a família extraordinária que tenho, cuja história, ensinamentos, valores e amor incondicional contribuíram para formar a pessoa que sou hoje. 

Foi também foi no dia 13 de março que meu coração caminhou “do céu ao inferno”. 

Poucos minutos após a imensa alegria de reencontrar minha irmã, fui surpreendida com a horrível notícia da tragédia ocorrida na Escola Estadual Raul Brasil de Suzano (SP). Busquei mais informações e, chocada, descobri que dois homens (de 17 e 25 anos) teriam entrado armados na escola e atacado (com armas de fogo, machado e outros instrumentos) alunos e funcionários do local, ferindo 11 pessoas, deixando 8 pessoas mortas e matando-se, em seguida! 

Segundo informações da polícia, o ataque foi planejado desde novembro de 2018 e poderia envolver outras pessoas, além dos dois atiradores mortos. Fiquei horrorizada! 

Minha mente “modo policial” prontamente buscou as possíveis motivações para algo assim acontecer, e principalmente, os caminhos para que essa tragédia fosse evitada... 

Já minha mente “modo mãe” entrou em colapso! Impossível entender como algo tão terrível e injustificável pôde acontecer a estudantes e pessoas inocentes que estavam na escola e em seu entorno! Uma escola! Um lugar “sagrado”, que deve ser protegido e tremendamente cuidado e que é, muitas vezes, um “segundo lar” amado e inesquecível para muitos jovens! 

Tragedia Suzano Homenagem

Ataque em Suzano fez 10 mortos, incluindo 2 atiradores

Arquivo

Confesso que o choque de sentimentos foi tão forte, que demorei vários dias para começar a ordenar racionalmente minhas opiniões sobre o assunto. E fui surpreendida pela minha “mente subconsciente”, que não parava de correlacionar a tragédia de Suzano/SP com outra tragédia igualmente chocante... em Brumadinho/MG. 


Por quê minha mente, meu “eu racional” insistia em lembrar de Brumadinho, toda vez que eu pensava em Suzano, e vice-versa? Por quê a insistência nessa trágica correlação? O que poderia haver de pontos em comum nessas tragédias? 

Impossível esquecer que no dia 25 de janeiro de 2019, ocorreu o rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, situada em Brumadinho, cidade da Região Metropolitana do Estado de Minas Gerais, deixando (segundo dados oficiais, até o momento) uma tragédia com 212 mortes confirmadas, 93 pessoas ainda desaparecidas e mais de 1.000 pessoas que perderam tudo, ou deixaram suas casas em razão da destruição ou do perigo iminente, além do incalculável prejuízo ambiental em razão da contaminação do Rio Paraopeba (afluente do Rio São Francisco) não só em Brumadinho, mas em diversas outras cidades e, mais gravemente, em Barão de Cocais, Nova Lima, Ouro Preto e Rio Preto, todas em Minas Gerais. Até hoje, dezenas de bombeiros e voluntários ainda buscam corpos desaparecidos sob a lama contaminada. 


Uma rápida pesquisa na internet traz informações dramáticas e chocantes, não só sobre Brumadinho, mas sobre vários desastres causados por rompimentos de barragens, com incalculável prejuízo humano, material e ambiental. 

Segundo uma publicação em um blog do Jornal “O Globo”, de 29 de janeiro de 2019, ocorre no Brasil um rompimento de barragem a cada 2 anos, conforme registros de uma sequência de tragédias, a partir de Nova Lima/MG (2001), Cataguases/MG (2003), Alagoa Nova/PB (2004), Miraí/MG (2007), Vilhena/RO (2008), Buriti dos Lopes/PI (2009), Laranjal do Jari/AP (2014), Itabirito/MG (2014) e Mariana/MG (2015), todas anteriores a Brumadinho e que totalizam, junto com esta última, quase 350 mortes, cerca de 1 milhão de pessoas severamente prejudicadas (dentre desabrigados, removidos e afetados), além da destruição de preciosos ecossistemas e danos ambientais. 

Quais os principais e mais evidentes pontos comuns entre todas essas tragédias? 

Salta aos nossos olhos a morte de inocentes, pessoas sem chance de autodefesa, surpreendidas pelas tragédias, “reféns” do risco iminente. Vítimas que morreram, ou foram gravemente prejudicadas pela ação – ou omissão dolosa – de alguém. 

A condição de maior ou menor vitimização é crucial, e pode ser melhorada com investimentos em infraestrutura, eficiência dos serviços públicos, educação, informação, preparação, conhecimento, participação comunitária e transparência, dentre outros. Ou seja, o grau de vitimização da comunidade está diretamente relacionado às prioridades e à eficiência do seu governo. 

Porque no dia 13 nasceu uma “reflexão dolorosa”, um grito de “basta” pela tragédia e pela urgente necessidade de reavaliar nossos rumos

 

Um governo que investe na educação e na cultura, que valoriza professores, escolas e esportes, torna a população mais esclarecida, capaz de defender-se e manter-se com dignidade. Um governo que trabalha com planejamento e transparência, desestimula o “jeitinho” e o mau uso do dinheiro público e torna-se mais eficiente.

Um governo que fortalece seus órgãos e instituições, aumenta a capacidade de garantir a lei e a ordem, fiscalizar, sanear não conformidades e prestar serviços essenciais com qualidade para a população. Um governo que combate a corrupção (em todos os seus níveis) e enfrenta a ineficiência, a excessiva burocracia da máquina pública, torna-se mais forte, fiscaliza melhor, previne mais os problemas e prioriza aquilo que é mais importante para as pessoas, como a educação, a saúde, a segurança, o bem estar... 

Assim, reduz-se em muito o risco de criminosos entrarem atirando em escolas, ferindo e matando inocentes... reduz-se o risco de rompimento de barragens, porque os seus gestores / responsáveis serão cobrados, serão devidamente fiscalizados, e as pessoas que vivem próximas estarão muito mais atentas e prevenidas em relação ao risco... 

Por outro lado, vidas foram ceifadas porque alguém agiu de forma criminosa, irresponsável, desrespeitou a lei e as pessoas. Alguém decidiu fazer o mal e causar danos. Alguém deixou de fazer a coisa certa. Tragédias aconteceram porque, em algum momento, houve dolo (que é a decisão de violar a lei, por ação ou omissão, saber do crime que está cometendo), desídia (não fazer esforço físico ou moral, ter preguiça, faltar atenção ou zelo; ser negligente) e desumanidade (ser bárbaro, cruel, não se importar, desrespeitar os outros).

Ou seja, por algum motivo, alguém decidiu ferir, matar ou, no mínimo “deixar para lá” um perigo iminente (que acabou ferindo ou matando). Assim, outro ponto comum às tragédias é o criminoso. Aquele indivíduo, motivado por alguma “justificativa injustificável”, que fere, mata ou causa danos a alguém ou à sociedade. 

Mas o que pode impedir (ou, no mínimo, desestimular) o criminoso? Vários estudos apontam que, além da educação e da cultura de um povo, a certeza da punição é fator indispensável para a redução do crime e da violência. A edição nº 1030 do Jornal “Observatório da Imprensa” afirma, por exemplo, que a certeza da impunidade leva ao aumento do crime. E em 30 anos de serviços diretamente dedicados à prevenção e combate ao crime e à violência, posso afirmar que essa é a mais absoluta verdade! 

Impunidade leva à reincidência criminal, que leva ao desperdício de esforços das forças de segurança (o famoso “enxugar gelo”), que leva à falta de civilidade, que leva ao... caos! 

Por fim, dentre os trágicos pontos comuns às tragédias estão as crenças e os valores pessoais, que tem raízes na base de toda sociedade: a família. 

Porque antes do criminoso, é certo que houve uma criança. E sempre acreditamos que essa criança foi amada por sua família, vivenciou bons exemplos, teve atenção, carinho e diálogo, que foi educada em valores essenciais a uma pessoa de bem... 

Queremos acreditar que houve uma família que ensinou valores como a fé, o respeito, a honestidade, a verdade, a humildade, o mérito do trabalho, a dedicação, a importância de fazer o bem, de tratar o outro como gostaria de ser tratado, a diferença do “certo” e do “errado”, dentre outros. Uma família que fortaleceu a crença de um Deus justo, que olha a todos e por todos, fazendo-nos crer que cada um de nós está aqui por uma razão e missão muito maior... 

Enfim, a “reflexão dolorosa” que vivenciei a partir deste dia 13 de março torna-se extraordinária, intensa, a ponto de me fazer acreditar que é sim possível conciliar os aprendizados gerados pelo amor e também pela dor.

A dor pode ser ressignificada e utilizada para o bem! O amor e a dor podem nos ensinar a aprender com os erros. 

Podemos aprender que é sim possível reduzir a vitimização das pessoas (e com isso prevenir as mortes de inocentes); é sim possível ter um governo que priorize corretamente, que invista forte na educação e na cultura (valorizando professores e todos aqueles que compõem o ambiente escolar); pode-se sim fortalecer as famílias (e consequentemente, a sociedade) por meio de políticas sociais sérias e equilibradas; é possível, sim, fortalecer os valores basilares a uma Nação forte e pujante... e, acima de tudo, somos capazes de combater verdadeiramente a impunidade e principalmente, o “câncer” maior que corrói impiedosamente nossa sociedade... a corrupção!!!

Precisamos saber que “basta”! 

E tudo começa por um ponto... a nossa própria atitude e exemplo! 

Se cada um fizer sua parte, todos se beneficiam... se cada um “varrer sua calçada”, a cidade será mais limpa... dentre tantas tragédias que geramos por dolo, desídia ou desumanidade, um dia, a vítima pode ser um de nós... 

Que o dia 13 de março, Suzanos e Brumadinhos, jamais sejam esquecidos! 

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